segunda-feira, 09 dezembro

Mais uma esperança para vegetarianos estritos que precisam de suplementação. Everton Fernando Alves

 

Quem nunca ouviu falar que vegetarianos têm deficiência de vitamina B12? Por muito tempo a mídia divulgou que a ausência de B12 (conhecida como cobalamina) é o pesadelo de toda pessoa que escolhe não ingerir produtos animais. A B12 é única entre as vitaminas porque é produzida somente por certas bactérias e, portanto, precisa passar por uma longa jornada até chegar a organismos multicelulares mais complexos como os animais, de onde, enfim, os carnívoros conseguem adquirir a quantidade necessária dessa vitamina.

 

É fato, portanto, que a principal fonte de B12 se encontra em alimentos derivados de animais. Segundo a organização norte-americana Food and Nutrition Board, a dose diária de vitamina B12 necessária para o organismo é de 2,4 µg (microgramas) para adultos, 1,2 µg para crianças de até oito anos e 2,8 µg para gestantes e mães que amamentam.

 

No entanto, o que a mídia popular não divulga é que nem todos os vegetarianos terão necessariamente falta de vitamina B12 no organismo. Estudos mostram que 40% dos vegetarianos nunca terão deficiência nenhuma da vitamina. Mais curioso ainda é o fato de que comer produtos animais não garante que os carnívoros não tenham deficiência de vitamina B12. Como sabemos disso? Pesquisa mostrou que 40% dos indivíduos que ingerem carne também apresentam carência de B12.

 

 

Mas qual é a função da vitamina B12? Essa vitamina é hidrossolúvel e ajuda a manter o metabolismo e a função do sistema nervoso central. Ela também reduz o risco de quebras cromossômicas levando a danos no DNA e é benéfica para os músculos. Esse nutriente participa da formação, integridade e maturação das células vermelhas do sangue, prevenindo especialmente a anemia megaloblástica. A vitamina B12 também tem sido recomendada para idosos, pois estudos apontam que ela previne a degeneração do cérebro.

Mas, então, quais são os sintomas da falta dessa vitamina? “Sua falta pode afetar a memória e a concentração, gerar formigamentos nas pernas e nas mãos e desencadear até anemia”, afirma Andréa Pereira, médica nutróloga do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo.

Ao contrário da crença popular, existem raros casos diagnosticados de vegetarianos estritos com déficit de B12. Isso porque há mecanismos complexos e maravilhosos no organismo humano de reaproveitamento e manutenção da quantidade anteriormente absorvida dessa vitamina. Especialmente por conta de uma circulação entero-hepática (entre o intestino e o fígado) muito eficiente que recupera grande parte da vitamina B12 excretada na bílis. Isso sugere que, para sua manutenção corporal, são mais importantes as questões ligadas ao metabolismo humano do que à quantidade ingerida.

Para quem é ovolactovegetariano, ou seja, aqueles que além de vegetais também ingerem ovos e derivados do leite, a preocupação é menor ainda. Isso porque ovos e leite possuem B12, embora estudos apontem que menos de 9% da B12 consumida do ovo é aproveitada pelos humanos.

Plantas cultivadas absorvem B12

Por muito tempo também se afirmou categoricamente que as plantas não sintetizam nem armazenam vitamina B12 e que essa vitamina existe somente nos vegetais, se eles forem contaminados por bactérias que a produzam. Esse é mais um mito que cai por terra diante das evidências científicas atuais.

Um estudo recentemente publicado na revista Cell Chemical Biology divulgou uma descoberta surpreendente de como o teor vitamínico de algumas plantas pode ser melhorado para tornar mais completas as dietas ovolactovegetarianas e vegetarianas estritas. A equipe de pesquisa, liderada pelo professor Martin Warren, da Escola de Biociências da Universidade Kent (Reino Unido), provou que os agriões comuns podem, de fato, absorver B12.

Que notícia fantástica, não é? Para os cientistas, a quantidade de B12 absorvida pelo agrião depende da quantidade presente no meio de crescimento. Após sete dias de crescimento, as folhas das plantas foram removidas, lavadas e analisadas. Utilizando uma técnica a partir de moléculas fluorescentes de B12, os pesquisadores observaram o caminho que a B12 percorre desde que as mudas a absorvem do meio de crescimento até a armazenagem em suas folhas, fornecendo evidências definitivas de que algumas plantas podem absorver e transportar B12. 

Mas esse não foi o único estudo nessa direção. Uma pesquisa realizada na Suíça já havia adicionado quantidades de análogo de B12 (cianocobalamina) ao solo de plantas de soja. Os pesquisadores observaram que 12-34% da B12 foram absorvidos pelas plantas. 66-87% da vitamina absorvida permaneceram nas raízes e o restante foi transportado para outras partes, principalmente as folhas.

Outro estudo analisou como os níveis de B12 nas plantas (soja, grãos de cevada e espinafre) eram afetados pela adição de esterco de vaca ao solo. Ao medir o análogo de B12 nas amostras das plantas e de ambos os solos fertilizados organicamente, o autor do estudo concluiu que a absorção de B12 pelas plantas do solo, especialmente do solo adubado com esterco, poderia fornecer B12 para os humanos, e pode ser por isso que alguns veganos, que não suplementam B12, não desenvolvem deficiência dessa vitamina.

Mas não para por aí. Pesquisa realizada em 2013 testou se a alface de crescimento hidropônico absorveria a vitamina B12 se ela fosse injetada no meio do cultivo. Os resultados mostraram que bastante B12 tinha sido absorvida e que duas folhas de alface poderiam conter 2,4 µg de B12. 

Algas marinhas como fonte de B12

Na sociedade em que vivemos, para prevenir a deficiência de vitamina B12 em populações que alguns grupos consideram de alto risco, como os vegetarianos, é necessário identificar, então, alimentos derivados de produtos naturais que contenham altos níveis de vitamina B12. E foi exatamente isso que fez uma equipe de cientistas cujos resultados foram publicados na revista Nutrients.

Esse estudo identificou uma quantidade substancial (133,8 g/100 g de peso seco) de vitamina B12 em pia roxo seca (nori). Nori, embora tecnicamente não seja uma planta, é uma espécie de folha feita a partir de algas marinhas amplamente utilizada em pratos da culinária japonesa. Uma pesquisa analisou o perfil nutricional de seis filhos veganos, com idades entre 4 e 10 anos, que consumiam dietas veganas incluindo arroz integral e pia roxo seco (nori), e sugeriu que o consumo de nori pode impedir a deficiência de B12 em crianças veganas.

O laver roxo seco, outra espécie de alga marinha, também contém altos níveis de B12 (cerca de 51,7g/100g seco). Aliás, metade de todas as espécies de algas absolutamente requer vitamina B12 para seu crescimento. Mas a microalga Chlorella também se destaca devido aos seus altos índices de B12.

Uma pesquisa publicada em 2010 na Current Gerontology and Geriatrics Research mostrou que os centenários coreanos que praticamente não comiam produtos animais tinham níveis normais de B12.

Os pesquisadores mediram o conteúdo de B12 em alimentos consumidos por esses centenários e descobriram que muitos dos alimentos fermentados (como o kimchi caseiro), consumidos em quase todas as suas refeições, e algas continham análogos ativos da vitamina B12. A conclusão é que os centenários estavam recebendo cerca de 30% (quantidade significante) de vitamina B12 de alimentos vegetais.

Outras fontes naturais

Níveis elevados de vitamina B12 foram detectados também no cogumelo seco shiitake, espécie Lentinula edodes (1,3–12,7 μg/100 g de peso seco) utilizada em vários pratos vegetarianos. Outras fontes não animais incluem ainda a spirulina (cianobactéria), o capim seco e a cevada.

Além disso, estudos têm demonstrado que o Lactobacillus reuteri  produz a B12 e que essa B12 é equivalente à cianocobalamina. Em um estudo realizado no Egito, crianças em idade escolar foram alimentadas com iogurte fermentado apenas com Lactobaccillus acidophilus – duas xícaras por dia. Após 42 dias, seu índice de B12 foi comparado ao de crianças que receberam iogurte comercialmente preparado.

Outro estudo analisou a alimentação de quatro veganos que incluía alimentos crus veganos e suplemento probiótico contendo Lactobacillus acidolphilus e outras espécies de Lactobacillus. Após três meses, os níveis de ácido metilmalônico (indicador de deficiência de vitamina B12) urinário de três dos quatro sujeitos diminuíram, embora não para níveis normais.

Para a Sociedade Vegetariana Brasileira, a vitamina B12 é o “único nutriente que um vegetariano pode precisar suplementar mesmo com uma dieta bem planejada”. Por outro lado, como vimos nesta matéria, isso não quer dizer que um vegetariano necessariamente terá a deficiência.

O meio de cultivo com B12 e sua absorção pelas plantas representa uma alternativa promissora para a resolução de problemas da comunidade vegetariana. No entanto, é importante aguardar novos resultados a fim de comprovar a eficácia dessas novas técnicas de cultivo para somente, então, depender de alimentos orgânicos como fonte exclusiva de vitamina B12.

É importante fazer um acompanhamento periódico com um nutricionista ou médico especializado, a fim de rastrear eventuais deficiências dessa vitamina. Em casos comprovados, ainda tem sido recomendado que os vegetarianos tomem suplementos alimentares de vitamina B12 e/ou consumam alimentos enriquecidos com a vitamina, como leites vegetais, alguns produtos de soja e alguns cereais matinais. 

 

Everton Fernando Alves é Mestre em Imunogenética pela UEM

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