sexta-feira, 26 abril

Riscos e rabiscos de brilho

Texto por: admin 21 julho, 2017 Sem comentários

Encha os olhos e o coração com alegria, esperança e paixão trazidos por momentos que você tem agora mesmo nas mãos

Quando acordei meu filho mais velho naquela madrugada, ele quase desistiu dos planos de observarmos a chuva de meteoros que daria seu melhor show às 4 da matina naquele dia. O frio incomodava, mas a curiosidade venceu. Meu marido ajeitou um colchão e alguns edredons sobre o telhado úmido de casa e lá nos esticamos para observar as “estrelas cadentes” que deveriam riscar nosso céu.

A gente mora em uma chácara pouco afastada da cidade e o céu estava magnífico. Começamos a identificar estrelas e grupos estrelares enquanto o espetáculo não começava. Todos os anos, mais ou menos na mesma época, dá para ver o céu sendo riscado por rastros de detritos deixados por algum cometa, que talvez esteja a anos de distância da nossa atmosfera, mas que deixou sua esteira de poeira inofensiva – a chuva de meteoros.

Para se observar qualquer chuva de meteoros a regra básica é ficar longe da poluição luminosa. Nenhum equipamento é necessário, pois os meteoros riscam uma boa extensão no céu e, nesse caso, binóculos ou telescópios apenas limitariam nossa visão. Mas a despeito da pesquisa rápida feita no dia anterior e do céu tão límpido sobre nós, não vimos nada por quase quinze minutos de observação…

Agora que a frustração tomava o lugar da empolgação os três ficaram calados imaginando se o madrugar não tinha sido inútil – especialmente eu, que ainda acordo muitas vezes de madrugada para atender a bebe mais nova que insiste em não dormir a noite inteira, e valorizo cada segundo que puder dormir.

Assim, no silencio, foi quando começamos a ver o céu ser delicadamente riscado aqui e acolá. Às vezes um satélite passava rapidinho entre os riscos marcados pelo rastro azulado. Simples, leves, fugazes – quase despretensiosos, iluminando nosso olhar.

O calar era necessário, até imprescindível. Enquanto falávamos alvoroçados, perdíamos o espetáculo. Mas o silêncio aumentava nossa percepção e até o campo de visão! E depois de quase duas horas de miragem, descemos daquele telhado com os olhos felizes da vida por ter visto aqueles risquinhos.

No barulho da vida que tudo manda para aqui e agora, é possível deixar passar risquinhos de iluminação que dão aquele sentido especial à existência, fazendo brilhar esperança. Um botão de flor que surge fora de época no seu jardim, o sorriso puro da criança que acredita de verdade que você é demais, um olhar de aceitação em meio à constante desilusão, um sanduíche na mão de quem passou o dia a pedir esmola, um agradecimento genuíno expresso apenas com olhos marejados… Instantes perolados da vida que riscam apenas o olhar mais atento, que valoriza um pouco de silêncio.

Se você anda cansado de esperar que a vida vá melhorar, que tal apenas observar aquilo que ela já está lhe dando? Encha então os olhos e o coração com risquinhos de alegria, esperança e paixão trazidos por momentos que você tem agora mesmo nas mãos.

Teru Gouveia é apresentadora do programa Vida & Saúde, da TV Novo Tempo

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